segunda-feira, 11 de julho de 2016

Moda: Várias suposições, uma realidade.

Estamos em plena época das semanas da moda europeias, onde as cidades de Paris, Milão e Londres constituem o palco das mais recentes criações dos mais conceituados estilistas do mundo da moda. Trata-se de um evento bastante ansiado pelos amantes da moda e styling, e deste modo, a Fashion Week tornou-se ao longo dos anos, um dos eventos de moda mais conceituados da atualidade.
ghjkkjhgfghghjhgfdfghjhgfjkl
No entanto, quando o tema “semana da moda” ou, na verdade, quando qualquer tópico relacionado com moda é supracitado, quer em artigos como este, quer numa mera conversa entre amigos, é em inúmeras situações facilmente interpretado como algo fútil, superficial vazio de conteúdo. Embora esse problema seja causado única e simplesmente pela nossa sociedade atual e pela existência de determinadas mentalidades específicas, trata-se de uma realidade e não há como fugir dela. Ou talvez haja. Talvez se deva começar a encarar a moda de uma forma mais “outside the box”. Não como “um conjunto de raparigas e rapazes que simplesmente desfilam numa passerelle com roupas de outros e que ganham dinheiro com isso”. Sim, esta é a mentalidade de inúmeras pessoas, infelizmente. Aliás, o pensamento é ainda mais pessimista quando se faz referência às mulheres deste mundo. A primeira conceção, embora seja algo legítimo, são as modelos com distúrbios alimentares e o ridículo tipo de corpo dito “perfeito” que a indústria da moda parece impingir à sociedade, bem como a sua influência na geração atual feminina. No entanto, embora este seja um problema legítimo e inegável, não é ele que caracteriza o mundo da moda. A moda não é isto. A moda é arte, a moda é indústria, a moda é história, progresso e inovação. Então e se a encararmos tal como ela é? Como uma arte tão legítima quanto o cinema, a música, a pintura, a dança e até a literatura? E se a encararmos como uma indústria que sofreu inúmeras revoluções e inovações até chegar aos dias de hoje? E se nos lembrarmos que as mulheres da moda não são apenas as modelos, mas sim as estilistas, que revolucionaram esta indústria, e que deste modo, alteraram o modo de viver de mulheres e homens por todo o mundo nas mais distintas épocas? Com este artigo venho falar exatamente disso, do facto da moda ser uma das mais importantes indústrias do mundo, bem como das pessoas que se envolvem nela e que a revolucionaram ao longo dos tempos.


Comecemos com Gabrielle “Coco” Chanel. A estilista francesa foi responsável por uma enorme e marcante transformação no vestuário feminino, acrescentando peças da alfaiataria na época da Segunda Guerra Mundial. Na década de 20, mais conhecida como “os loucos anos 20”, Chanel criou peças bastante versáteis e práticas, que permitiam às mulheres uma maior mobilidade, libertando-as das roupas rígidas que eram características até à data, e permitiu igualmente que as mulheres utilizassem peças que anteriormente seriam exclusivas do guarda-roupa masculino, como as calças, o que lhes proporcionou, embora apenas de uma forma abstrata, uma expressão do ideal de autonomia que tanto desejavam na época em questão. Umas das suas criações mais icónicas – e ainda atual – é o emblemático LBD (Little Black Dress), peça essa considerada atualmente um dos essenciais de qualquer guarda-roupa feminino. 


De seguida, falemos de Miuccia Prada, uma ex-militante do Partido Comunista Italiano e formada em Ciência Política. Miuccia herdou da família a indústria Prada, até então marca produtora de bagagens, bolsas e artigos de couro, e transformou-a numa marca de malas (de mão e de viagem) e baús feitos à mão. Mais tarde começou a desenhar roupas e a Prada tornou-se numa das marcas de moda mais consagradas do mundo, de renome mundial e numa potência poderosíssima de moda, que lança tendências, produz conceitos e move multidões, sendo considerada um símbolo de luxo e status. No entanto, por mais feminina que seja a marca, a estilista tem sempre como objetivo principal escapar um pouco das coleções ditas sensuais, focando-se numa moda intelectual, para mulheres inteligentes, bem informadas e inovadoras, o que mais uma vez desmente um pouco o estereótipo que é imposto à moda e às estilistas, mostrando que moda pode também significar inteligência, poder, atitude. A editora da Vogue americana, Anna Wintour, chegou a declarar que “Prada é o único motivo para alguém assistir à semana de moda de Milão”.


Falemos agora de Mary Quant, uma estilista britânica que na década de 60 foi a responsável pela criação da mini-saia. Na sua juventude, Mary criava as suas próprias roupas, e começou a comercializá-las pois considerava a moda daquela época “terrivelmente feia”. Mais tarde, criou um diminuto pedaço de pano que acabaria por revolucionar totalmente o guarda roupa feminino: a mini-saia. As saias até então usadas por todas as mulheres tinham aproximadamente 30cm de comprimento nada tinham a ver com esta peça, o que simbolizou um choque radical na época e na sociedade em questão. No entanto, o choque gera sempre a mudança, e em poucos anos, Mary Quant expandiu esta tendência de uma forma absolutamente voraz, com milhares de pontos de venda em todo o mundo. A sua loja tornou-se então, o símbolo da vanguarda dos anos 60 e 70.


Stella McCartney, filha do grande ex-beatle Paul McCartney, é uma estilista britânica e, para além de ter tido a sorte de estagiar com Christian Lacroix aos 15 anos e ter trabalhado com Tom Ford na Gucci, em 2001, criou a marca de luxo que tem o seu nome, e Stella é conhecida por ser a porta-voz dos direitos dos animais e por não utilizar pele nem couro nas suas coleções, sendo a pioneira da moda vegan e ambientalmente consciente, tendo assim um papel importantíssimo na defesa dos animais, numa indústria que, sejamos sinceros, consegue ser por vezes muito cruel para com eles. Tudo isto é algo bastante importante sendo que o uso de peles e couro nas coleções dos estilistas constitui um dos temas mais polémicos que caracteriza o mundo da moda. As suas coleções são caracterizadas pelo minimalismo, peças femininas com toques andrógenos, tudo com o selo “Fur free fur”, ou seja, pele livre de pele.


Outra vanguardista foi a revolucionária Vivienne Westwood. Foi considerada uma das pioneiras da moda punk na década de 70. Se Londres é considerada a capital da moda rock n’ rol, Westwood é definitivamente uma das maiores responsáveis por este facto. A estilista fundou a marca Let it Rock, com o propósito de marcar a diferença na indústria. E conseguiu. O estilo punk, incluindo a moda BDSM (Bondage, Domination, Sadism and Masochism), foi então caracterizado por roupas em couro com frases eróticas, alfinetes, rasgões, pins de bandas punk e protestantes, tachas, coleiras, látex, maquilhagem e penteados extravagantes, o que tornou todo este movimento e este estilo num tremendo choque e numa revolução no mundo da moda na época em questão. Vivienne chegou a vestir a histórica banda punk Sex Pistols, e atualmente, é reconhecida como a maior representante da moda inglesa, com as suas coleções excêntricas e provocadoras, que criticam a política e a sociedade atuais. 


Por último, mas não menos importante, falemos agora de uma mulher com M grande, que demonstrou que depois do abismo, é possível reerguer todo um império, até mesmo quando é considerado algo impossível. Donatella Versace. Era a conselheira crítica e fonte de inspiração para o seu irmão, Gianni Versace, e foi, até à morte do mesmo, a denominada “grande mulher por trás de um grande homem” no que diz respeito à marca que ambos desenvolveram, Versace. Em 1997, Gianni foi brutalmente assassinado, e Donatella assumiu o papel de head-designer da marca, enfrentando inúmeros obstáculos e reticências relativamente ao seu trabalho, dada a sua figura polémica e excêntrica. No entanto, com o passar dos anos, Donatella, mantendo-se polémica e sempre fiel a si mesma, confirmou ser a escolha certa para assumir a marca e para o sucesso do seu empreendimento, tendo conseguido reerguer o império Versace, sendo que ainda hoje comanda a marca e continua a produzir grandes sucessos no mundo da moda atual.


Deste modo, é possível concluir que de facto, se refletirmos corretamente, a moda consegue ter uma conotação diferente da estereotipada. A moda é muito mais que modelos. A moda é muito mais que roupas, passerelles, luzes, foco, notícias, distúrbios alimentares, peles, droga, burla. A moda não tem de ser algo encarado como fútil, vazio de conteúdo, supérfluo, sem importância, algo idiota ou como uma perda de tempo. Quem critica este mundo desta forma tão radical, certamente critica de olhos vendados, pois decerto desconhece todas as inúmeras implicações sociológicas e psicológicas que envolvem todo este mundo. A moda é indústria, cultura, história, inovação, quebra, criação. Com a sua ciclicidade, e, no entanto, também com todas as suas mudanças, a moda retrata transformações em relação a épocas, a culturas e sociedades, bem como a indivíduos. A moda é eterna, mas tudo o que nela está contida é efémero. É também possível concluir que na indústria da moda tanto homens como mulheres podem assumir o mesmo papel e ter exatamente o mesmo sucesso, sendo que qualquer uma das estilistas que referi acima podem ser associadas, por semelhança ou disparidade, a estilistas como Giorgio Armani, Calvin Klein, Christian Dior, Tom Ford, Valentino Garavani e Yves Saint Laurent, por exemplo. Ou seja, mais uma vez, destruímos mais um dos estereótipos de que a moda seria feita para as mulheres, quando na realidade a moda é feita para o mundo, independentemente da idade, etnia, localização geográfica, religião, cultura, género e orientação sexual. 

A moda é de todos, para todos.